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Não-ideias
14.09.2014

2001-
Marta Neves

“Em 1974, Lucimar desejou ter uma ideia para ganhar algum dinheiro e tirar o marido do sufoco. Nunca conseguiu pensar em nada e seguiram todos pobres”. “Babalu quis a vida inteira ser Jesus Cristo, mas, já que não teve ideia de como se transformar no Salvador, tornou-se funcionário do Banco do Brasil”. “C nunca teve ideia de como abordar sexualmente o seu ex- -professor de economia e atual prefeito, e amarga até hoje sua vida de homossexual solitário”.

Estas são apenas algumas das muitas sentenças da série Não-ideias, de Marta Neves. Todas elas sugerem um desejo intimo ou uma vontade de mudança de uma condição presente – dos mais comuns aos mais estranhos ou ambiciosos – que são inviabilizados pela falta de ideias dos protagonistas de como alcançá-los. A própria imaginação é dissolvida justamente pela ausência de imaginação. Porém, na narrativa de Marta Neves, a proposição não resolvida, supostamente fracassada, retorna de forma bem-humorada diante da dificuldade de tomar iniciativas na nossa realidade mais ordinária. Esse vazio das não ideias é, curiosamente, a fonte mais preciosa de imaginação das pessoas – o que se vê em certo brilho estranho de seus relatos. Só o descanso das ideias parece poder manter viva a força de tê-las.

Na rotina acelerada das grandes cidades contemporâneas, parece impossível pensar que a experiência do desencanto – desde o campo mais privado e íntimo até a esfera coletiva e social, marcada pela descrença cada vez mais frequente em nossos sistemas econômico e político – possa gerar algum tipo de produtividade. Em resposta, as Não-ideias se colocam, do mesmo modo que outras ações artísticas de Marta Neves, como parada obrigatória para o reencantamento com o mundo; uma abertura para compartilhar publicamente não-ideias pelas quais, e somente assim, é possível produzir novas formas de imaginar. – LP

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